A primeira consulta na psicóloga
A primeira consulta na psicóloga foi estranha. Por ironia do destino, talvez, certo dia estava a ver uns desenhos animados na televisão quando um dos bonecos foi a um psicólogo e a consulta passou-se com o profissional de saúde a mostrar uns desenhos estranhos e perguntar o que é que o boneco via neles.
Como a minha imaginação era, e ainda é, muito fértil, comecei a ensaiar várias respostas na minha cabeça para o caso de ela me mostrar os tais desenhos para eu interpretar. Porém, tal não aconteceu.
Na primeira consulta eu seria acompanhado pela minha mãe mas as seguintes eu já deveria estar sozinho com ela. Então, após ela se apresentar, disse-me que podia confiar inteiramente nela para lhe contar o que quer que fosse, que gostava que eu a visse como a minha melhor amiga. "Deve estar a brincar", foi logo o que eu pensei. Tinha acabado de a conhecer e ela já estava a propor ser a minha melhor amiga? Bem que podia esperar sentada. Reparem que eu sempre fui às consultas contrariado, porque era obrigado a ir.
O que eu mais odiava era quando ela me obrigava a falar do meu pai. Era um assunto muito sensível, porque o meu pai não esteve presente uma grande parte da minha vida, e ela insistia comigo em todas as consultas para lhe contar como a falta da presença do meu pai me fazia sentir. Era uma tortura! Tantas vezes reprimi o choro por vergonha porque quando eu chorava na escola toda a gente dizia que era um miúdo mimado e sensível tal como uma menina (professores incluídos!).
Nunca me esqueço de uma pergunta que me fez certo dia: "quando vês os desenhos animados que mais gostas, alguma imaginaste estar no meio deles?" Respondi-lhe logo que não. Era mentira, jamais poderia afirmar isso porque vivia aterrorizado com a possibilidade de ser internado num hospital psiquiátrico. Mas sim, sempre me imaginei no meio deles. Imaginava que tinha um Pokémon que me defenderia de todos aqueles que me queriam fazer mal. E imaginava-me num mundo totalmente paralelo.
Na maior parte das consultas mantinha-me calado a olhar para o tampo da mesa que até hoje me lembro da cor. Eu não queria falar com ela. Aquela psicóloga nunca conseguiu arrancar nada de mim! E quem me dera poder voltar atrás no tempo! Certamente que teria outro tipo de atitude. E talvez me tivesse tornado num adulto mais seguro de si mesmo.